Protagonistas mais maduros ou na terceira idade não são comuns na literatura atual. Contudo, eles podem proporcionar uma narrativa e visão de mundo muito interessante, que coloca em perspectiva muita coisa que a gente ignora.
A caderneta de endereços vermelha, da autora Sofia Lundberg, é um livro como esse.
Doris, nossa protagonista, tem 96 anos, vive sozinha em Estocolmo e está com saúde fragilizada. Ela resolve registrar suas memórias no papel para que sua sobrinha neta, que mora nos Estados Unidos, mantenha sua lembrança viva. Com o agravamento das condições de saúde, Doris confronta sua vida, seus sentimentos e lamenta que todos os nomes registrados na sua velha caderneta de endereços vermelha partiram. Mas será que todos já se foram mesmo?
“Tantos nomes passam por nós ao longo da vida. Já pensou nisso , Jenny? Todos os nomes que vêm e voltam. Isso nos corta o coração e nos faz verter lágrimas. Tornam-se amores ou inimigos. Às vezes eu folheio a minha caderneta de endereços. Tornou-se o mapa da minha vida, e gostaria de falar um pouco com você a respeito. Para que você, que vai ser a única a se lembrar de mim, também se lembre da minha vida. Uma espécie de testamento. Vou dar minhas memórias a você.
Elas são a coisa mais bonita que tenho.“
Eu gostei muito de Doris. Ela tem uma história dolorida e difícil, mas ao mesmo tempo muito bonita, que vale conhecer. Suas reflexões sobre o tempo e o amor são poderosas e nos ensinam muito. O relacionamento com sua sobrinha neta é a base da história, e, surpreendentemente, é inspirada em fatos reais. Sofia Lundberg tem uma tia-avó chamada Doris, já falecida, que tinha uma caderneta vermelha de endereços. Ver os nomes dos amigos e familiares da velha tia riscados na caderneta, com a anotação “morto” ao lado dos nomes, ficou marcado na mente da autora por anos.
E que bom que a autora foi bem sucedida em nos contar essa história. Há uma conversa entre gerações que se faz necessária e foi bem trabalhada. Trouxe uma certa humanização da velhice e de suas consequências físicas e psicológicas, e nos faz refletir sobre nossas ações para com os nossos familiares mais idosos.
Pode parecer, mas não é um livro de todo triste. Ele tem um romance que vai deixar você com lágrimas nos olhos e com o coração quentinho. Ainda que um pouco fantasioso nesse quesito, eu gostei. Trouxe um final feliz que eu gostaria que todos, no fim da vida, pudessem vivenciar. O que me deixou ainda mais contente sobre o livro foi ver o amor com que a autora Sofia Lundberg tem por ele. Ela fez questão de deixar um comentário quando postei sobre o livro no Instagram, agradecendo por ter lido a história de Doris.
De certa maneira, as memórias de Doris foram dadas a nós, leitores, e desse modo, ela continuará viva na lembrança de muitos.
E deixo em destaque que a tradução de Claudio Carina, para essa linda edição da Globo Livros ( essa capa é uma obra prima, sério ), está muito boa e acessível. Uma boa aquisição para qualquer estante.
Eu estou apaixonada por essa! Curto muito livros com protagonistas mais maduros, sempre adquirimos muitos ensinamentos. Adorei a proposta do livro.